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terça-feira, 30 de agosto de 2011

Juíza acusada de delegar audiências não será investigada

Por considerar inválidos os elementos apresentados contra uma juíza, acusada de não presidir as audiências e delegar tal função aos assessores, o Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, por ampla maioria, decidiu não abrir procedimento disciplinar contra ela. Segundo o procurador-geral da OAB do Rio, Ronaldo Cramer, a seccional vai levar o caso ao Conselho Nacional de Justiça.
O caso veio à tona em julho de 2010. Reportagem do jornal O Dia afirmou que as audiências eram comandadas por funcionárias do cartório nos Juizados Cível e Criminal de Inhomirim e Guapimirim em Magé (RJ).
Durante o julgamento, nesta segunda-feira (29/8), o Tribunal negou o pedido feito pelo advogado da juíza para que houvesse sigilo. Apenas dois desembargadores entenderam que, se a parte pedia que a sessão fosse sigilosa, ela deveria ser. Os demais frisaram que as sessões de procedimento contra juiz têm sido abertas.
No julgamento, o procurador da OAB, Ronaldo Cramer, afirmou que a seccional tomou conhecimento da situação na Vara e no Juizado onde a juíza Myriam Cury atuava por meio de representações de advogados que atuam na comarca. Posteriormente, uma repórter do jornal se passou por bacharel e filmou uma audiência. A seccional levou o caso à Corregedoria do Tribunal, que, por sua vez, decidiu fazer uma inspeção nos dois órgãos jurisdicionais pelo qual a juíza respondia.
Já a juíza, que foi defendida pela Associação dos Magistrados do Estado do Rio de Janeiro (Amaerj), afirmou que, após receber as reclamações, a Corregedoria do TJ fluminense fez a inspeção e não encontrou nenhuma irregularidade nas serventias. Segundo a defesa, o caso teve uma repercussão maior devido à reportagem do jornal. O advogado disse, ainda, que as gravações feitas pelo jornal eram ilícitas e seu conteúdo se revelava favorável à juíza.
A defesa disse que as audiências eram presididas por Myriam Cury, ficando a cargo das funcionárias do cartório a parte preliminar. Como a sala de julgamento ficava ao lado do gabinete da juíza, com as portas abertas, esta poderia ir até lá sempre que sua presença fizesse necessária, disse o advogado. A defesa citou, ainda, texto do colunista da ConJur, Vladimir Passos de Freitas, sobre os juizados estarem abarrotados.
Durante a sustentação, o advogado afirmou que em Magé, não há juízes leigos nem conciliadores. Assim, a juíza buscou funcionárias do cartório para auxiliá-la. "Todos fazem isso."
Primeiro a falar, o corregedor Azevedo Pinto entendeu que havia elementos para analisar melhor o caso. Além da reportagem do jornal, o corregedor considerou a decisão de um juiz de Direito, que substituiu a juíza nas suas férias, que anulou, a pedido do MP decisões que haviam sido arquivadas em audiências realizadas no dia apontado na notícia. O corregedor, o único a votar pela abertura do procedimento, disse, no entanto, que não era caso de afastamento da juíza.
O decano do TJ fluminense, desembargador Luiz Zveiter, lembrou que, quando era presidente da Corte, em uma reunião com advogados de Magé, soube do caso e ligou para juíza a fim de saber o que estava acontecendo. No mesmo momento, disse, repassava as informações aos advogados. O desembargador afirmou que a juíza é diligente e lembrou que é grande a distância entre Guapimirim e Inhomirim, dois locais onde ela atuava. Segundo Zveiter, a juíza explicou que, como não tinha conciliadores, contava com a ajuda das funcionárias para agilizar o andamento dos processos. Ao fazer o levantamento da estatística da juíza, Zveiter percebeu que ela estava em dia. Por isso, votou pelo arquivamento, rechaçando a ideia de que, na dúvida, melhor instaurar o procedimento.
Os desembargadores Nascimento Póvoas e Sergio Lucio disseram que houve má interpretação da conduta. Eles contaram que, quando juízes, não havia tempo hábil para presidir todas as audiências. Treinava servidores que faziam um esboço da ata. Ao votar contra a abertura do procedimento, Póvoas disse que uma acusação recebida já é uma punição, sobretudo para juízes do interior.
Prova contaminada
Os desembargadores Valmir de Oliveira, Bernardo Garcez e Letícia Sardas votaram pelo arquivamento da representação e foram além: entenderam que deveriam ser extraídas peças da representação e encaminhadas ao Ministério Público para que fossem apurados eventuais crimes.
"A juíza foi tratada como bandido. Se bem que bandido tem tratamento mais respeitoso", disse Valmir de Oliveira. Ele citou a Lei de Interceptações Telefônicas e disse que é preciso ter autorização judicial para fazer a gravação. Para ele, a OAB-RJ se valeu de uma prova inconstitucional. O desembargador votou no sentido de se apurar criminalmente a conduta até mesmo dos advogados que entraram com a representação na Corregedoria, o que causou surpresa à seccional.
Os desembargadores criticaram, ainda, a postura do juiz que substituiu a juíza durante as férias. De acordo com os julgadores, com base na notícia do jornal, ele determinou que fossem desarquivadas cerca de oito ações no Juizado Criminal. "Nem com pedido do Ministério Público o juiz pode anular uma decisão benéfica ao réu", disse o desembargador Valmir de Oliveira.
A desembargadora Letícia Sardas complementou, dizendo que a promotora pediu a anulação das decisões referentes à violência doméstica. As decisões teriam sido arquivadas por desistência das vítimas. Entretanto, disse a desembargadora, a promotora sequer acompanhou as audiências e soube do que aconteceu por meio do jornal. Posteriormente, os casos foram novamente arquivados.
Os demais desembargadores se mostraram contra a extração de peças. Luiz Zveiter e José Figueiredo disseram que não se pode cercear a liberdade de imprensa. Sérgio Verani divergiu por outro motivo: como o sistema é acusatório, cabe ao MP abrir um procedimento para apurar se houve crime ou não. Já Luiz Fernando Ribeiro de Carvalho disse que a extração de peças e a remessa ao MP poderiam inibir e emitir o recado de que é preciso ter uma prova inequívoca para que haja representação contra juiz.
Fonte: ConJur

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